“A sociedade adoece a gente no processo de viver E no processo de se
descobrir como desviante do padrão imposto. É importante fazer terapia”. Wanda
Marques Araújo
No dia 22.06.2019, no primeiro momento da oficina, finalizamos uma
atividade que foi iniciada no sábado anterior; que consistia em conversar sobre
como mulheres lésbicas e bissexuais se sentem em relação a determinados temas
como: suas vivências no espaço escolar – lugar que pode ser emancipador ou
extremamente violento -, no espaço de saúde - comentou-se sobre consultas
ginecológicas, e como médicos não estão muito preparados para atender mulheres
que não sejam o padrão esperado de heterossexualidade -, sobre amor, sobre
vivências no espaço familiar etc. Houve
muita troca. Falamos também sobre sexo seguro entre mulheres, informação que é
pouco divulgada.
A Carol comentou sobre o livro “A princesa e a costureira”, que parece
muito interessante para explicar para crianças que existem outras orientações
sexuais para além do padrão heteronormativo.
O lanche junino foi
maravilhoso.
No segundo momento, tivemos a oficina da Wanda Marques Araújo, Professora
e Transfeminista.
Ela falou sobre os rígidos estereótipos de gênero com os quais lidamos
mesmo antes de nascer, principalmente as mulheres: “A gente nasce num mundo
pronto, com conceitos, cultura, questões sociais pré-estabelecidos que moldam/
direcionam a vida e escolhas das pessoas. É difícil até para as mulheres cis se
enquadrarem em todas essas exigências sociais tão rígidas, imagina para as
trans. O que determina se você é mulher ou não é como você se identifica, e não
esses estereótipos sociais. É mais uma formação da identidade, do pensamento,
que depende somente da pessoa, e que para além de questões biológicas é em
parte construído ao longo do tempo também”.
Explicou ainda que os termos Cis e Trans surgem por uma necessidade de conceituar
essas diferenças para evitar uma prevalência de termos pejorativos, para que
todas as pessoas trans não sejam tratadas como uma farsa.
A sociedade brasileira tem uma determinação muito limitada de gênero:
considerando unicamente a genitália, e não como a pessoa se identifica. Wanda
fez a distinção de identidade de gênero e orientação sexual, ponderando que o
fato de se identificar como mulher não necessariamente significa que o
interesse afetivo sexual dessa mulher será por homens. Relacionamentos são
construídos por questões individuais, e não pré-determinados por genitálias.
Wanda comentou sobre o embate entre o RadiFem e o Transfeminismo, muitas
vezes pautado demais em questões biológicas, contudo salientou que ela
pessoalmente prefere não entrar muito nessa discussão, por achar ser pouco
produtiva para pessoas trans.
Falou sobre sua percepção e experiência de que uma mulher trans sofre
mais preconceito na sociedade do que um gay cisgênero. E a importância de
garantir o direito ao corpo das pessoas trans, de poder alterar seus corpos sem
precisar corresponder a estereótipos. Nem dos estereótipos do padrão
heteronormativo e nem os novos estereótipos que muitas vezes a sociedade cobra
que as mulheres trans correspondam enquanto mulheres, por exemplo. “Hoje eu
escolhi vir assim “montada”, mas eu não uso essa roupa e todos esses acessórios
no dia a dia”.
Wanda comentou sobre o conceito de passabilidade. Que de forma
extremamente sucinta e superficial registro a seguir como: andar na rua sem
perceberem que você é trans para inclusive evitar de sofrer possíveis
violências. “Quando me leem como mulher cis eu não estou tão segura, quando me
leem como trans eu estou menos segura ainda”.
Falou-se também sobre as “pequenas agressões diárias”:
·
Não perguntar se a pessoa operou;
·
Não perguntar qual era seu nome antes da
transição;
·
Tratar a pessoa pelo sexo biológico sendo que a
pessoa reivindica outra identidade;
·
As risadinhas nos lugares incomodam.
É preciso ter consciência de que as vezes o que você fala fere.
Wanda disse que é comum pessoas transgênero evitarem serviços de saúde, e
como a necessidade de procurar por esses serviços gera grande estresse e
insegurança. Discutimos sobre serviços para homens e serviços para mulheres, ao
invés de existir uma preocupação em atender gente em nossa sociedade falocentrada.
A oficineira evita os termos camisinha masculina e camisinha feminina, mas usa
camisinhas penianas e camisinhas vaginais.
A sociedade brasileira tenta guardar todo mundo em caixinhas rígidas, e
quando não consegue a reação é de incômodo e violência. Brasil é o país que
mais mata LGBTs e ao mesmo tempo o que mais consome pornografia LGBT. Wanda
também falou sobre o lugar que é associado a pessoas trans e a travestis: a
prostituição, a violência, a rua.
Algumas conquistas: transexualidade saiu do conceito de transtorno
mental/ desvio mental da OMS. E hoje é possível fazer a identificação do sexo
em documentos sem precisar passar pelo juiz, dá para fazer no cartório,
tornando o processo menos burocrático. Há o CREAS da diversidade na 615 sul, e
o ambulatório trans na 508 sul.
Falamos sobre o debate da transexualidade nos esportes que está começando
a ser feito. E sobre tratamentos hormonais, na possibilidade de tomar
bloqueadores hormonais até os 18 anos de idade, para que depois se decida sobre
tomar ou não determinados hormônios bem como fazer cirurgias. Wanda explicou
também como são feitas as cirurgias de transição de sexo. “Deixar as pessoas
descobrirem e vivenciarem sua sexualidade, sem o controle dos corpos que
pretende forças as pessoas atenderem demandas e expectativas sociais”. E
ressaltou também que a adolescência é uma fase em que geralmente muitas pessoas
começam a dar os sinais de sua transexualidade e começam a se entender assim.
Então é uma idade para os adultos prestarem atenção e serem o apoio que esses
jovens que estão se percebendo enquanto trans precisam.
A oficineira nos informou que é possível casais trans terem filhos. Se
for um homem trans com uma mulher trans, o casal precisa apenas suspender o uso
hormonal antes de engravidar, durante a gravidez e durante a amamentação,
voltando a utilizar os hormônios depois. “Família vai muito além de questões de
sangue”, muito além desse conceito tão fechado, limitado de família que usam
inclusive para justificarem preconceitos com os transexuais alegando que LGBTs
não são capazes de gerar crianças.
Nenhum comentário:
Postar um comentário